quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Espelhos

O espelho nunca mente. Aquele menino que antes eu via, cresceu. Seus olhos ficaram mais frios, suas mãos mais calejadas, suas palavras mais afiadas e seu reflexo mais distante. O mundo mágico se desfez. Morreram os coelhos brancos, os relógios o alcançaram.
Quando pequeno, esse momento parecia que nunca ia chegar. Os castelos impalpáveis eram sólidos como as pedras e eternos como as montanhas; os inimigos invisíveis eram mais preocupantes que aquilo o que os amigos vêem de mim e as princesas seqüestradas estavam muito mais próximas do que estavam as aflições do coração.
Mas, aos poucos, os castelos se desfizeram como pedras de areia e os inimigos e as princesas deram espaço à vergonha e ao desencanto. Foram ficando para trás, deixados para depois, até que se tornaram uma vaga memória nos olhos congelados de um homem esquecido.
A memória, porém, é eterna e os olhos são os espelhos da alma. Enquanto ainda houver nos olhos lembranças de uma infância passada, ela continuará viva. A quela criança que antes eu via, não cresceu. Os olhos não mentem. Os espelhos não mentem.